sábado, 2 de outubro de 2021

SOBRE ESTREMOZ

 

“E pela hora do crepúsculo saudoso, como em profética visão, eu vi Estremoz renascer como Fênix, das suas cinzas, transformada no pomar festivo da cidade, no celeiro farto do povo, em estância preferida do verão”.

Dom José Pereira Alves, 3º bispo de Natal.

 

 

A Vila de Estremoz foi criada por Alvará de 06 de junho de 1755, tendo sido instalada em 03 de maio de 1760.

A transferência de sede para a povoação da Boca da Mata, com a denominação de Ceará-Mirim, ocorreu pela lei provincial nº 321 de 18 de agosto de 1855, sendo essa lei revogada pela de nº 345 de 04 de setembro de 1856 e restabelecida a lei nº 321 pela de nº 370 de 31 de julho de 1858 quando se deu nessa data a instalação da nova sede municipal em Ceará-Mirim. Pela lei provincial nº 837 de 09 de julho de 1882 Ceará-Mirim foi alçada a categoria de cidade.

Enquanto foi sede municipal a vila de Estremoz tinha por prédios públicos a Casa de Câmara e Cadeia, o Pelourinho, a Igreja Matriz de São Miguel Arcanjo e Nossa Senhoras dos Prazeres, ambos oragos da matriz e o Convento anexo a igreja, construído pelos Jesuítas. No entorno da praça que havia entre a igreja e o cruzeiro ladeavam as casas geminadas dos habitantes, a maioria simples, pois os proprietários mais abastados residiam nas propriedades de suas fazendas e engenhos ao longo do vale do Ceará-Mirim e Maxaranguape. Ao tempo em que figurou como município Estremoz tinha por municípios limítrofes a Capital, Touros, São Gonçalo e Macau.

De 03/05/1760 a 31/07/1858, ou seja, 98 anos o município de Estremoz teve uma vida política e administrativa autônoma cuja sede era a vila que denominava o município, a atual cidade de Estremoz, na região metropolitana de Natal.

Esse período de tempo é pouco conhecido da história de Estremoz, por isso eis o escopo desse trabalho que é o de trazer a luz memória esquecida da vida política e administrativa do município de Estremoz quando sua sede figurava na Vila, assim como o período em que figurou como distrito de Ceará-Mirim, apagada e esquecida, quase moribunda correndo o risco de deixar de existir até os eu ressurgimento como município autonomia em 1958.

As fontes de pesquisas foram as crônicas dos mais diversos jornais (muitos dos quais extintos) e os relatórios e falas dos presidentes da então província do Rio Grande do Norte, os quais se configuram como fontes primárias posto que revelam o dia-a-dia daquele município.

O trabalho é despretensioso e não segue nenhuma metodologia cientifica a não ser o desejo de contribuir para a conservação da memória deste que foi uma dos mais injustiçados municípios do Rio Grande do Norte condenado a quase perder por completo sua história riquíssima desde os tempos coloniais.

A erudição profética de Dom José Pereira Alves, 3º Bispo de Natal, sintetizou poeticamente na epigrafe citada a cima a história de Estremoz onde tal qual a Fênix ressurgiu das cinzas no chão do território potiguar.

A par dessa introdução nas próximas postagens trataremos da vida política e administrativa do município de Estremoz.

Pórtico da entrada da cidade de Estremoz.



domingo, 26 de setembro de 2021

SOBRE A ADUTORA DO MATO GRANDE


         Prestes a completar 40 anos de sua inauguração em 2022 é sempre bom fazer a memória dessa que foi uma das maiores obras de alcance social no século XX na Região do Mato Grande.

         Em 1981 foi aberta a concorrência para a aquisição do material destinado a instalação da adutora do Mato Grande com captação de água na fonte de Pureza.

         Segundo o governador Lavoisier Maia naquele ano já estava assegurado no orçamento do BNH recursos no valor de 400 milhões de cruzeiros. (DIÁRIO DE NATAL, 02/07/1981, p.1).

         A adutora do Mato Grande deveria resolver o mais grave problema que durante muito tempo enfrentava as populações de João Câmara, Taipu e Poço Branco.

         O sistema integrado de abastecimento de água dos municípios de João Câmara, Taipu e Poço Branco ficou pronto em 1982, o qual trouxe benefícios imediatos para mais de 25 mil habitantes entre os três municípios, dos quais 75% estavam concentrados na cidade de João Câmara, apontada já a época como centro de desenvolvimento da região do Mato Grande.

O sistema tem capacidade de vazão de 300 litros de água por segundo, sendo que a  demanda das três cidades a época era de 144 litros por segundo.

         O investimento global da obra foi da ordem de 1,6 bilhões de cruzeiros tendo o projeto o objetivo de atender a uma população final de 50 mil habitantes. (DIÁRIO DE NATAL, 15/03/1983, p.15).

         O sistema integrado de abastecimento de água do Mato Grande foi construído constando de um conjunto de adutoras que somadas possuem 50 km extensão, com diâmetros variando entre 150 mm e 400 mm.Também fazem parte do sistema 3 estações elevatórias, uma com vaza de 260 m³/h, outra com 204 m³/h e a terceira com 43 m³/h todas equipadas com um conjunto de eletrobombas.

         O sistema tem ainda 4 reservatórios, sendo 2 em João Câmara, uma com capacidade para 3,2m³ e outro para 150 m³, 1 em Poço Branco, com capacidade para 350m³ e o de Taipu com capacidade para 400 m³. O primeiro reservatório concluído foi o de Poço Branco, os dois que ficam em João Câmara foram o segundo e o terceiro a ser construído, respectivamente,  o quarto reservatório construído foi o de Taipu e mais um em Poço Branco seria o quinto a ser construído.

         A rede de distribuição tem 37.998 metros de extensão, dos quais 26.640 em João Câmara, 5.858 em Taipu e 3.500 em Poço Branco.

A Região do Mato Grande teve desde sempre a falta de acesso a água um dos seus principais problemas sociais, sendo a adutora um antigo anseio da população dos municípios que foram por ela beneficiados.

         Por longos anos o abastecimento de água de João Câmara, Taipu e Poço Branco dependeu de idas e vindas dos precários carros-pipas, que eram por vezes saudados com euforia pela população com suas chegadas e até mesmo os bucólicos burrinhos com suas barricas d’água serviam como meio de transporte do liquido precioso.

         Quem passa pela BR-406 talvez nem se dê conta da tubulação aparente em suas margens e nem reflita sobre esta obra que foi sem dúvida a redenção de mais 50 mil pessoas entre os municípios de Taipu, Poço Branco e João Câmara.



Fotos: Diário de Natal, 1982.


quinta-feira, 16 de setembro de 2021

SOBRE OBRAS NA MATRIZ DE CEARÁ-MIRIM EM 1892


         De acordo com o jornal O Nortista achava-se em trabalho no serviço da capela-mor da matriz de Ceará-Mirim, o pintor e dourador Manoel Adolfo d silva Ramos, que a convite do vigário da freguesia foi até a cidade de Ceará-Mirim e com o vigário empreitou algumas obras na referida igreja sob orientação dada pelo engenheiro David Wiliams, por 4 contos de réis, cujos serviços a fazer constavam do seguinte  (O NORTISTA, 09/09/1892, p.3):

         Douramento da capela-mor com todos os frisos dourados amordente fusco, branco a verniz a imitação de porcelana, começando do teto frisos dourados, como frisos azuis celeste – o centro do forro branco fingindo a estuque e nele a efígie da Padroeira  Nossa Senhora da Conceição pintada sobre zinco.

         Descendo a cornija, fingindo mármore roxo quase branco, acompanhando todas as tribunas, travessas e arco-mor da mesma cor, sendo os pedestais em mármore escuro, secundando outra vez de cima uma sanefa debaixo da cornija ultramarino ou fingindo damasco amarelo de Nanquim cor de ouro, sendo o centro roxo rei claro, chegando até as barras paralelas que seriam de quadros vivos, fingindo a mármore de diversas cores preso a uns cordéis, e os vidros das tribunas fingindo mosaico e os de entre os nichos da mesma capela-mor do lado dos caixilhos bordado a pincel, os da frente branco limpo, dos lados do nicho do centro quatro anjos em adoração à Custódia, sendo dois de cada lado. Pintura a óleo fino. As portas e tribunas de verde-azul ultramarino, quase branco. Grades de ferro com douramento para as tribunas e arco-mor da mesma capela e nesta ladrilho de tijolo mosaico fino.

         Segundo o mesmo jornal o vigário de Ceará-Mirim, Pe. Antonio Antunes de Oliveira e o tenente-coronel José Antunes de Oliveira estavam empenhados pelo fim das obras da matriz e seu aformoseamento, onde os mesmos fizeram as torres e o frontispício da igreja, sendo as torres descritas pelo mesmo jornal como “elegantes e salientes de que avistadas ao longe  a tudo sobressaem”, e continuavam com gosto no trabalho da frente mesma matriz. (O NORTISTA, 09/09/1892, p.3).

         Ainda de acordo com o jornal citado o vigário trabalhava como empenho, zelo e eficácia, para ver concluído todo o trabalho da matriz, para o que já não só havia saído a pedir auxílios aos senhores de engenho da cidade de Ceará-Mirim e de Maxaranguape, dos quais recebeu assinaturas e espórtulas que chegaram a mais de 3:000$000 de réis; além disso estava elevando sua voz  na tribuna sagrada chamando a todos os seus paroquianos para concorrerem com suas esmolas e mostrando-lhes o dever que haviam de cooperarem para o sagrado fim, e para que chegassem ao conhecimento de todos, este dever e o seu apelo (O NORTISTA, 09/09/1892, p.3).

O autor do texto (que se assinou como ‘um paroquiano’) recorria a imprensa para que fosse publicado o plano do vigário na esperança que os paroquianos não se olvidassem o auxilio necessário para aquela obra a qual "enobreceria a Religião e que seria elevado ao  Trono de Deus onde se receberia a única e verdadeira recompensa". (O NORTISTA, 09/09/1892, p.3).

          Ao longo do tempo a igreja matriz de Ceará-Mirim passou por inúmeras intervenções que pouca coisa ou quase nada mais remete a esta primeira obra de aformoseamento dessa igreja.

         Ainda em 1896 a matriz de Ceará-Mirim estava em inacabada, mas mesmo assim o bispo da Paraíba, Dom Adauto de Miranda Henriques, nela fez visita pastoral e em julho daquele mesmo ano, o referido bispo transferiu a matriz para a capela da povoação de Taipu permanecendo lá até agosto de 1897. 

            A matriz de Ceará-Mirim só foi finalmente concluída em 1900, tendo suas obras se iniciado em 1861, portanto, 49 anos.


Detalhe da fachada da igreja matriz de Ceará-Mirim


Aspecto da capela-mor da matriz de Ceará-Mirim

Aspecto de uma capela lateral da matriz de Ceará-Mirim


Detalhe de um púlpito lateral da matriz de Ceará-Mirim.

Detalhe do teto da matriz de Ceará-Mirim e seus afrescos

Aspectos internos da matriz de Ceará-Mirim.

Aspectos internos da matriz de Ceará-Mirim.

Detalhes das torres da igreja matriz de Ceará-Mirim.


Aspectos externos da matriz de Ceará-Mirim.


sexta-feira, 27 de agosto de 2021

MANIFESTAÇÃO POLITICA EM BAIXA VERDE EM 1898


Segundo o jornal A República foi marcado para o dia 15/02/1898 uma reunião politica com a presença do chefe republicano, o coronel Felismino do Rego Dantas, na povoação de Baixa Verde, onde dispunha de todo o eleitorado que era leal e dedicado.

O coronel Felismino Dantas de fato ali chegou, quando esperavam ansiosos todos os seus amigos ali residentes fazendo naquela povoação uma entrada triunfante "porque o acompanhava crescidíssimo número de cavalheiros". Antes de chegarem a Baixa Verde foi se incorporando a cavalgada que já era bastante crescida desde a vila do Taiu, por onde passou aquele chefe politico, grupos de 6, 8 e mais cavalheiros.

As 09h00 da manhã do dia 16/02/1898 quando ali chegou ouviram-se nos ares girandolas de foguetes, ao mesmo tempo que dentre a multidão se ouviam estrepitosos vivas à democracia brasileira, ao senador Pedro Velho, ao Governador do Estado e ao coronel Felismino Dantas.

Houve um jantar para mais de 100 pessoas, inclusive senhoras.

À noite daquele mesmo dia houve animadíssima soireé, que se prolongou até as 05h00 da manhã, "reinando sempre a melhor ordem, e divisando-se nos semblantes dos circundantes grande júbilo e satisfação que lhes proporcionava aquela reunião de sinceros republicanos".

Desde a chegada do coronel Felismino Dantas até sua partida no dia seguinte à tarde "foguetes e girandolas fendiam os ares quase constantemente".

À hora da partida viu-se o chefe republicano da região sendo festejado por grande número de amigos, que o acompanharam até a grande distância donde então voltaram a seus lares, depois de darem-lhe o abraço de despedida e lhe assegurarem mais uma vez o seu apoio ao partido chefiado pelo mesmo coronel,  "o qual, pela sua boa orientação politica, traz arregimentado sob sua bandeira um partido invencível" ( A REPÚBLICA, 26/02/1898, p.2).

É uma das mais antigas, se não o primeiro, comício realizado no Mato Grande já registrado.

         Além de chefe do partido republicano na região do rio Ceará-Mirim, o coronel Felismino Dantas foi intendente do município homônimo.

Coronel Felismino Dantas.


O CINEMATÓGRAFO EM NATAL


"Dessa bela novidade

fui à primeira função,

E saí pensado mesmo

Ser aquilo arte do cão!"

A epigrafe a cima foi assinada por um certo Lulu Capeta e registrado no jornal A República em 19/04/1898 para se referir a novidade do cinema em Natal, à época chamado de cinematógrafo.

De fato era novidade a exibição de cenas em movimento visto ter sido a invenção dos irmãos Lumiere aparecido em 1895.

Uma visão mais otimista que a de Lulu Capeta do cinematógrafo foi exibida no mesmo jornal, segundo o qual:

"Sábado à noite o Sr. Nicolau Parente fez uma excelente exibição do cinematógrafo - mais uma das grandes aplicações da eletricidade, devida ao grande gênio de Edison. O trabalho agradou bastante e é uma das melhores diversões que temos gozado nesta capital".

Ainda de acordo com o citado jornal foram exibidas naquele sábado cenas do Jubileu da rainha Vitória, "onde viam-se todos os movimentos do grande cortejo", os Banhos da Alvorada, a Catedral de Milão, o Casamento do Príncipe de Nápoles, o Panorama de Veneza, a Chegada em Gondolas, a Comida aos Pombos na Praça São Marcos e a Chegada do Trem.

Sobre a exibição desses filmes escreveu o jornalista de A República: É de notar a naturalidade com que são apresentadas todas as cenas, dando a ilusão do natural. Os 'Banhos da Alvorada', sobretudo, merecem os favores do público distinguindo-se perfeitamente os gestos dos banhistas e os salpicos d'água".

De acordo ainda com o jornal citado o Sr. Parente pretendia demora-se na capital potiguar, exibindo muitas outras cenas do cinematógrafo, no entanto os filmes seriam sempre os mesmos, ou seja o jubileu da Rainha Vitória, os Banhos da Alvorada e a Chegada do trem, apesar de prometer nos dias seguintes serem mais variados.

"O público ficará agradavelmente e surpreendido com as aplicações do cinematógrafo, e é de esperar que proporcione extraordinárias enchentes à excelentes distração de que nos vimos ocupando" escreveu o jornalista do jornal citado (A REPÚBLICA, 19/04/1898, p.1).





Recortes do anúncio de exibição do cinematógrafo em Natal.
Fonte: A República, 19/04/1898, p.1.

No dia 26/04/1898 o jornal A República voltou a se ocupar da novidade do cinematógrafo em Natal, onde escreveu: "conforme estava anunciado o Sr. Nicola Maria Parente, sábado à noite, exibiu novas e interessantes vistas no 'Cinematógrafo', satisfazendo, como sempre, às exigências do público desta capital, sequioso de diversões agradáveis de um povo civilizado"( A REPÚBLICA, 26/04/1898, p.2).

Dentre as cenas exibidas salientou o jornal citado a naturalidade admirável da cena "os jogadores de cartas" e o "homem cão". Entretanto, o que mais mais surpreendeu, de acordo com o mesmo jornal, foi o final do quadro "banhos da alvorada" em que "naturalmente por uma inversão das fotografias ou do aparelho projetor, os banhistas que atiravam-se à água tornavam a ascender como impelidos por uma mola, dando cambalhotas no ar e indo cair precisamente nas extremidades dos trampolins que tinham servido para lhes darem impulso no primitivo salto. É o caso de dizermos: digam os sábios da escritura, que segredos são esses da natura" ( A REPÚBLICA, 26/04/1898, p.2).Eis, então, a mais antiga, se não a primeira, descrição de um filme cinematográfico e sua critica feita em Natal.

De acordo com o mesmo jornal a exibição dos filmes naquele dia atraiu bastantes pessoas tendo o jornalista usado a expressão "a enchente foi completa"  para indicar que o o local das exibições estava lotado.

Se prometia novas exibições no dia seguinte.

O cinematógrafo foi uma invenção dos irmãos Louis e Auguste Lumiere o qual o patentearam em 13/02/1895.

O aperfeiçoamento capital introduzido nesse aparelho foi o de substituir e desenrolar continuamente a película por um movimento descontinuo, cortado de interrupções regulares, que permitia uma maior duração da iluminação, 1/24 de segundos para 16 imagens por segundo, ao invés de 1/6.000 do Kinetoscopia de Edison.

Dos filmes listados a cima que foram os primeiros a serem exibidos em Natal encontramos apenas a chegada do trem na estação que é o primeiro filme de cinema a ser produzido em 1895.O link desse filme está a baixo.

https://www.youtube.com/watch?v=LWwYhG4UW8E