quinta-feira, 12 de julho de 2018

CÂMARA CASCUDO E AS IGREJAS DO RN NA DÉCADA DE 1930


      Uma mania de remodelação de prédios antigos, incluindo igrejas coloniais estava se propagando no Brasil pelos idos da década de 1930 e o Rio Grande do Norte não escapou ileso a esse (des)movimento em desfavor da arte.
         Com essa onda de reformas as igrejas do interior passaram a não apresentar mais a fisionomia de suas arquiteturas originais.
         Em 1934 Câmara Cascudo em companhia da caravana do então Interventor Federal (governador) Mário Câmara esteve em visita ao interior do estado, ao retornar escreveu no jornal A República uma serie de crônicas de sua viagem nas quais falou sobre as igrejas potiguares de então. Eis o que ele escreveu:
         De todos os templos que visitei no Estado (nos 37 municípios que conheço quase todos são incaracterísticos e já não podem ser apontados como estilos. São testemunhas de várias tarefas de conserto onde as mais mãos desviaram de seu trilho o espírito arquitetural daquelas capelas seculares.
         A igreja de Patu é ainda uma capelinha, mas sem fisionomia. A de Augusto Severo[1] severa, pesada, maciça, recorda o românico em sua fase inicial. A de Caraúbas é tipo comum das igrejas “conservadas”. É moderna. As de Luis Gomes e Pau dos Ferros guardam traços deliciosos. A primeira é interessante com suas torres quase quandragular e lisas, sem ornato, nuas e álgidas, dando um aspecto de sisudez hirta. A de Pau dos Ferros é mais imponente com seu frontão singelo mais equilibrado.
         A imponência da igreja de São Sebastião[2] não encontra rivalidades nem com a Matriz de Mossoró. Todas perdem para a nobre simplicidade da capelinha de Nossa Senhora dos impossíveis, no cimo da Serra do Lima (em Patu), barroco pobre, sem decoração, sem enfeite, sem conchas e golfinhos, com um recorte triste numa frontaria branca e melancólica  de ermida colonial.Mas é acolhedora em sua pobreza mística.Sente-se a atmosfera pura da linhas erguidas com  o desejo religioso.Vê-se que foi um trabalho feito por promessa e modificado posteriormente sem que a construção perdesse a seu ar recatado e humilde de eremitério cenobitico e de pouso de oração silenciosa.
         Com relação a outras igrejas do interior do Rio Grande do Norte disse Câmara Cascudo: Assu, Ceará-Mirim, Mossoró, Caicó, não tem história em suas paredes, vinte vezes alteradas.Tanto podiam estar no nordeste brasileiro como na Austrália.Nada tem de nós porque as despojaram de sua herança de cem anos.
         Basta recordar que Natal só possui uma igreja digna de conservação. É a igreja de Santo Antônio, feita em 1766, num barroco jesuítico impressionante e distinto. Vivo tremendo com a ideia de uma “reforma”, de uma “melhoria”, naquele frontão que viu o amanhecer da Cidade.
         O enxerto dessa crônica de Câmara Cascudo foi publicado no jornal Diário de Pernambuco na edição do dia 22.06.1934, p.3.
         A baixo algumas igrejas citada por Câmara Cascudo nesse texto e como ele as viu na época em que fez a referida viagem.

                                             Catedral de Mossoró

          Justamente no ano da viagem e da publicação da crônica cascudiana a igreja matriz de Mossoró foi elevada a dignidade de catedral diocesana com a criação da Diocese de Mossoró em 1934.A arquitetura da igreja, no entanto, já havia sofrido as modificações de que fala Cascudo como o frontão, as torres e o acréscimo da cúpula, são as "vinte vezes remodeladas" que fala Câmara Cascudo.ao visitar a cidade de Mossoró em 1934 a igreja em nada parecia com a igreja original da cidade de outrora.

                                                            igreja matriz de Assu

       É uma das igreja mais antigas do estado do Rio Grande do Norte, porém "vintes vezes alterada" usando a expressão de Câmara Cascudo.

                                                              Catedral de Caicó
  
          A época da viagem de Câmara Cascudo o bispado de Caicó ainda não havia sido criado.Esta é a igreja matriz de Caicó em 1936, 3 anos antes de ser elevada a dignidade de catedral diocesana.A arquitetura ainda era a anterior as reformas por qual passaria posteriormente, exibindo nessa imagem a configuração românica colonial na fachada e apenas uma torre ( na década de 1940 foi erguida a segunda torre). foi dessa forma que Câmara Cascudo a viu em sua viagem que segundo ele a matriz de Caicó também já havia sido "vinte vezes alterada".

                                                            Matriz de Caraúbas

           Segundo Câmara Cascudo a igreja matriz  de Caraúbas é (era) tipo comum das igrejas “conservadas”.supomos que a expressão usada por Cascudo se refira ao fato de a igreja ainda conservar seus traços arquitetônicos originais.No entanto a igreja de São Sebastião nem sempre teve essa conformação sendo visíveis os acréscimos que nelas foram postos como o aumento do corpo da igreja, a torre sineira e a outra torre "falsa" inacabada.

                               igreja matriz de Ceará-Mirim
         Outra igreja que segundo a expressão cascudiana foi "vinte vezes alterada".De fato a igreja de Nossa Senhora da Conceição teve alterações em suas características arquitetônicas.O frontão e a fachada neoclássicas contrastam com as torres góticas em formato de agulhas.Nem por isso tira dela o esplendor de sua imponência.

                                                   igreja matriz de Luís  Gomes


      Esta foi a antiga igreja matriz de Luis Gomes vista por Câmara Cascudo em sua viagem em 1934.Apesar de ser uma igreja matriz a conformação arquitetônica mais lembrava uma capela.As características arquitetônicas são conflitantes percebendo que também esta foi alterada ao longo do tempo.

                                               Matriz de Pau dos Ferros 

       Esta é a antiga igreja de Pau dos Ferros que segundo Câmara Cascudo "é (era) mais imponente com seu frontão singelo mais equilibrado"[3].

                           Igreja matriz de Augusto Severo (Campo Grande)

           A igreja matriz de Santana de Campo Grande é antiga também, aqui vista da mesma forma que foi vista por Câmara Cascudo em sua viagem em 1934.





[1] Atualmente Campo Grande.
[2] Câmara Cascudo não especifica qual igreja se refere, supomos seja a de Caraúbas que tem como padroeiro São Sebastião.
[3] O parêntese é nosso.

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