quinta-feira, 19 de novembro de 2020

PANORAMA NADA ABONADOR DE NOVA CRUZ EM 1924


         Um panorama nada abonador foi descrito do município de Nova Cruz em 1924 pelo O Jornal de João Pessoa-PB. Segue na integra a descrição feita pelo referido jornal.

         Nova Cruz, a cidade ameaçada pelas enchentes periódicas do Curimataú, apresenta atualmente o aspecto contristador de bem acentuada decadência.As ruas e praças encobertas pelo matagal lembram as antigas cidades bíblicas devastadas pelo castigo dos céus. A administração municipal nada tem feito de 20 anos a esta parte, nãos e podendo registrar um único melhoramento feito a custa dos cofres da Intendência local.

O povo bom e generoso, descrente do reaparecimento da moral política do município e do ressurgimento da sua vida econômica, permanece na mais desoladora apatia. O cargo de chefe político e o emprego de presidente da câmara desta circunscrição, neste Estado, são exercidos por um cidadão oriundo da margem esquerda do rio Bujari, no Estado da Paraíba, que nas horas de lazer se dedica ao cultivo da língua encantadora de Vieira e Camões, formando novos vocábulos e trocadilhos interessantes que lhe tem celebrizado o nome.

Não obstante haver homens ali capazes e idôneos para o cargo da administração pública tem sido importados de outras paragens delegados, subdelegado, juízes distritais, intendentes, etc., achando-se todas as posições de destaque assaltadas e ocupadas por indivíduos de procedência ignorada e méritos ainda não revelados.

         Essa atitude infeliz do atual Chefe tem acarretado desgostos e notável prejuízo para o interesse da coletividade. Querem ver até a que ponto chegou o relaxamento dos negócios públicos em Nova Cruz? Pasmem! Não há intendência; as sessões da Câmara, quando por circunstâncias de interesse privado tem de ser efetuadas, são feitas em um quarto de um armazém comercial, o quartel e cadeia pública funcionam em um salão de um casa encrava no centro comercial da cidade, o matadouro público é nas capoeiras e os açougues são pocilgas imundas.

         Os empregados municipais que percebem insignificantes ordenados lutam para recebê-los do tesoureiro que é genro do chefe e que paga as portarias por metade, auferindo por este trabalho insano gratificações pingues. As rendas do município desapareceram por encanto! Ultimamente naquela terra tão honrosa o assunto principal nas conversas são as falências.

Efetivamente, em Nova Cruz há falências comerciais e falência moral administrativa, falência de critério na escolha dos homens para os cargos e falência de escrúpulo na aplicação dos dinheiros públicos; há, finalmente, a grande falência da política. Felizmente em meio daquela decadência material, proveniente de uma administração inconsciente  e mal aconselhada, na derrocada dos princípios moralizadores da vida das sociedades e da sã política, ainda permanece invulnerável e inviolada, assente sobre o seu verdadeiro trono – a justiça – amparada por um homem da elevada moral de Dr. Vicente Lemos, alma intangível do dever, da honra, a quem da politicagem malsã não logrou atingir.

         Firme no seu posto de honra, intransigente no cumprimento da lei tem por isso mesmo voltado contra sua pessoa o ódio ferrenho dos politiqueiros exploradores. Diante de tamanho descalabro ou o Exmo. Sr. Governador do Estado lança as suas vistas providenciais para aquele município ou ele desaparecerá por falta de higiene moral, política e administrativa.

      Para terminar essa apreciação sobre aquele município relato o seguinte fato interessante: contam que um negociante de um dos municípios deste Estado, estando prestes a abrir falência, foi ao Dr. Pedro Velho, de quem era amigo e correligionário, depois de expor as suas condições precárias, solicitou um emprego. O velho político respondeu-lhe que lhe daria o emprego com muito prazer, perguntando-lhe qual o que desejava. O negociante respondeu-lhe imediatamente: “eu quero uma intendência para sustentar minha família que é muito numerosa”. Pedro Velho deu uma boa gargalhada, sacudiu a basta cabeleira e colocou o amigo. Esse caso, há muito tempo está tendo hoje a sua aplicação em Nova Cruz. (O Correspondente).

                                 Aspectos de Nova Cruz em 1922












Fonte: o jornal,21/05/1924,p.8.

Fotos: o Malho,1922,p.34.1923,p.28

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