sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

O ESCAFANDRISTA DO PORTO DE NATAL

 

         Em 17/04/1906 o porto de Natal estava em obras. A novidade era o uso do escafandro para observar o fundo do rio Potengi auxiliando na desobstrução do canal do porto.

         De acordo com A República “agora, que nosso porto vai trabalhar um escafandrista, não virão fora de propósito as notas extraídas e resumidamente propositalmente para este fim do livro de Louis Figuier, Les merveilles de La science.

         O “resumo proposital” daria um livro e como não é esse nosso propósito aqui vamos poupar o leitor de enfadonho texto, apesar de bem colocadas notas, é demasiado citar o artigo, basta dizer, porém, que o citado livro dizia que o “escafandro é um aparelho relativamente moderno, seu uso prático data da segunda metade do século XIX”.

         De acordo com o jornal A República, o escafandrista que estava trabalhando nas obras do porto de Natal era Manoel Gaya, contando naquele ano 60 anos de idade e 40 de experiência em mergulhar nas águas do rio Potengi e sobre o uso do escafandro por ele dizia o citado jornal “é um contemporâneo dos aperfeiçoamentos que o tem tornado praticável”.

         De acordo com o jornal citado antes daquela época, eram muito imperfeitos os aparelhos empregados nos trabalhos e explorações submarinas. ”Mergulhava-se a fôlego como até hoje se tem mergulhado no nosso rio e na nossa costa” e mesmo assim, muito restritamente. Até o século XVIII quase que o homem só mergulhava para fins de guerra, dizia A República. (A REPÚBLICA, 17/04/1906, p.1).

Os mergulhos do escafandrista Manoel Gaya

         Continuavam as obras do porto com o trabalho de desentulho e arrasamento da ponta sul do recife da Baixinha.

De 14h00 as 16h00 da tarde, quando o estado da maré ali era ordinariamente agitada o escafandrista Manoel Gaya deu 4 mergulhos consecutivos, demorando-se debaixo d’água entre 5 e 15 minutos conforme necessário para a execução dos  serviços.

         Neste espaço de tempo, lin- [... texto ilegível devido erro de impressão no original] da carcaça do navio submerso, que foram suspensas e descarregadas no batelão de ferro acostado ao pontão ‘Souza Gomes’, ali fundeado e onde estava montada a aparelhagem. (A REPÚBLICA, 18/04/1906, p.1).

         Dando-se, porém, que diversas madeiras, entre as peças lingadas e quebravam no ar, tal era o estado de fraqueza das suas fibras resistentes, o engenheiro Pereira Simões, chefe da Comissão de Melhoramento do Porto, mandou as 16h00 suspender o trabalho do escafandrista e fazer funcionar a draga de cofre dobradiça, assentada no mesmo pontão, que até as 17h00 extraiu muito madeirame, ferragens e utensílios do navio submerso, além de grande quantidade de pedras do recife anteriormente quebradas pelo pilão de uma tonelada que havia sido ali colocado desde o começo de 1904 pela mesma comissão de melhoramentos do porto.

         O escafandrista Manoel Gaya mergulhou ainda naquele dia fazendo explorações nas vizinhanças do recife interno da Baixinha , cujo terço deveria ser esmagado na direção sul para o norte, conforme o projeto Souza Gomes, que o engenheiro Pereira Simões foi chamado a executar.

         Em 17/04/1906 depois de diversos golpes do pilão mecânico sobre a ponta da Baixinha para ir quebrando-a, o escafandrista desceu nas proximidades da boia, mais ao sul dos mergulhos anteriores.

A  maré estava  de vazante e o vento que soprava forte tornava a água muito agitada.Seguindo até meio caminho voltou Manoel Gaya a superfície da água depois de 5 minutos de exame e observação. (A REPÚBLICA, 18/04/1906, p.1).

Achou ele, conforme informou, entre o cavername do velho navio submerso deparando-se com uma verdadeira barreira de destroços espontados, o que o obrigou a recuar, não só porque a mangueira de ar, a corda de salvação  ou tubo da corneta acústica podiam por ali  por ali engravar-se e ser isto fatal para ele, como porque começaram  a faltar-lhe as forças para continuar a caminhada por entre o cavername do navio, lutando com a correnteza.

Imersão do escafandrista Manoel Gaya para colocar uma bomba de dinamite no fundo do rio Potengi para explodir os recife da Baixinha.  Foto: O Malho, ed.0263,1906, p.24.

         Manoel Gaya, era segundo o jornal A República, um já velho, com mais de 40 anos de prática de serviço, forte e vigoroso, porém excessivamente prudente, o que determinou a sua escolha por parte do engenheiro Simões, que já o conhecia e estava habilitado a depositar toda sua confiança nas suas informações. (A REPÚBLICA, 18/04/1906, p.1).

         O escafandrista, recuando em tempo da exploração que se lhe afigurava no momento perigosa, logo que subiu, designou o ponto mais ou menos onde era forte o acumulo de madeirame e ferragens e ali desceu imediatamente o cofre da draga Priestman, que com sua garras movediças começou a extrair tais destroços. (A REPÚBLICA, 18/04/1906, p.1).

         Esse desentulho deveria continuar ainda por mais algum tempo, sendo oportuna, em vista do resultado obtido, novas descidas do mergulhador escafandrista Manoel Gaya, que se ocupava em outros serviços de bordo, mas tinha uma gratificação nos dias em que mergulhava nas águas do rio Potengi a serviço da desobstrução do canal do porto.


 Draga de alcatruzes ‘Miguel Calmon’ aprofundando o ancoradouro da Alfandega, no porto interno de Natal, a fim de que pudesse as pontes de descarga dos vapores de maior calado, que estavam demandando no porto. Esta draga, denominada ‘5 de Agosto’, estava no porto da Paraíba fora de serviço, tendo sido enviada pelo ministro da viação a comissão de melhoramentos do porto de Natal, tendo sido seus serviços relevantes nas obras de dragagem do porto. Na opinião do comandante Guimarães, do Llyod Brasileiro, o porto de Natal era um dos mais vastos do Brasil. Foto: O Malho, 1906,p.29.




Pontão ‘Lauro Muller’  com os aparelhos completos do pilão de Lobnitz e a draga ‘Priestman’ de 5 toneladas destinadas ao arrasamento da Baixinha. De acordo com a revista O Malho o prosseguimento metódico das obras faria do porto da Capital do Rio Grande do Norte um dos melhores do Brasil. Foto: O Malho, 1907.




Draga de cofre dobradiço ‘Souza Gomes’ desentulhando a pedra quebrada dos recifes internos da Baixinha, na barra do porto de Natal. Foto tirada pelo engenheiro auxiliar da comissão de melhoramento do porto Otávio Arantes. Foto: O Malho, 1908, p.28.



                        Aspecto do porto de Natal em 1908.Foto: O Malho, 1908.


Um comentário:

  1. Uma tecnologia moderna para época do Porto de Natal na engenharia e atualmente uma peça de museu. Como diz o trecho da música do cantor e compositor Caetano Veloso" Tempo,tempo, tempo, tempo" na música "Oração ao tempo".

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