Um trem da EFSC foi atacado em João
Câmara quando se dirigia para a cidade de São Rafael em 16/02/1959.Uma multidão
de populares comandada pelo jornalista Geraldo Melo, que concitou o povo a
retirar a água existente num dos vagões tanques e ainda toda a lenha existente
na fornalha da composição.
A
multidão obstruiu a linha com dormentes impedindo o avanço do comboio e depois
colocaram novos dormentes do lado oposto ao maquinista, prendendo o trem evitando
que prosseguisse viagem.
O motivo do ataque
Segundo
informações preliminares do jornal Diário de Natal a atitude verificada em João
Câmara foi uma represália em consequência da suspensão d’água que a EFSC fazia
para a cidade de João Câmara, fornecimento que havia sendo feito a algum tempo
por preço irrisório. Com a encampação da EFSC a Rede Ferroviária S.A, houve um
reajuste dos preços.
A
água era vendida pela prefeitura com grande margem de lucro, segundo o jornal
Diário de Natal (DIÁRIO DE NATAL, 16/02/1959, p. 2) e depois do reajustamento a
própria prefeitura tratou de triplicar o preço do liquido.
Ainda
segundo o mesmo jornal “Depois percebendo que não existia a necessidade imprescindível
do fornecimento da água para Baixa Verde, que possui açudes e não se ressentiria
da falta do liquido e ainda porque o abastecimento pela Rede provocava prejuízos
a ferrovia, resolveu a administração local suspender a ida do vagão tanque para
a cidade referida”.
A interferência do deputado Aluízio Alves
Surgiu
o deputado Aluízio Alves que interferiu junto ao presidente da RFFSA Renato
Feio solicitando a reconsideração da medida conseguindo que o vagão tanque da
EFSC voltaria a abastecer João Câmara.
Como
a autorização demorou a chegar, o povo passou a assaltar os trens roubando toda
a água que levavam, sempre obstruindo a linha férrea com dormentes, naquele ano
de 1959 já haviam sido 3 assaltos a trens em João Câmara, tendo sido o dia 16/02/1959
o que teve maior gravidade o qual determinou a suspensão dos trens para João Câmara
pela diretoria da RFFSA, ficando os trens estacionados em Ceará-Mirim.
Segundo
o Diário de Natal o delegado regional da RFFSA tomou as providencias imediatas
ao tomar conhecimento do fato e denunciando os revoltosos a polícia.
Fonte: DIÁRIO DE NATAL, 16/02/1959,
p. 2.
Parece
que as informações publicadas pelo jornal citado não foram bem explicadas tanto
que o diretor da RFFSA escreveu ao jornal para que fosse publicada uma nova
reportagem desta vez esclarecendo os fatos ocorridos em João Câmara conforme
veremos a seguir.
Esclarecimento da diretoria da RFFSA sobre o
ataque do trem
O
delegado regional da RFFSA em Natal escreveu ao diário de Natal para esclarecimento
do que ocorrera em Baixa Verde sobre os ataques aos trens que transportavam água
para a cidade.
Transcrevemos
na integração que foi publicado a pedido pelo referido diretor no jornal citado.
Título de introdução da matéria de esclarecimento
“ABASTECIMENTO D’ÁGUA PELA RFN A BAIXA VERDE SEMPRE FOI NORMAL”.
Subtítulo “Carta de esclarecimento do
delegado em Natal”
Introdução da retificação do jornal: “Recebemos
com pedido de publicação a seguinte carta:”
Texto do delegado regional da RFFSA José
Manoel Vanderlei Filho:
Natal, 18 de fevereiro de 1959
Sr. Diretor do jornal “DIÁRIO DE
NATAL”, li na última página do vosso conceituado jornal no número do dia 17 do
corrente um artigo intitulado “distúrbios em Baixa Verde...” diversos tópicos
que não correspondem as informações prestadas por telefone a esse jornal,
quando me foi pedido explicasse o que
ocorrera.
Assim,
para esclarecer-vos, bem como ao público em geral, peço seja publicado no mesmo
local as seguintes informações:
Sobre
o tópico represália “segundo informações da própria Sampaio Correia, a atitude
verificada ontem foi uma represália em consequência da suspensão no fornecimento
d’água que aquela ferrovia fazia para Baixa Verde”, desejo seja esclarecido que
não houve interrupção do fornecimento d’água para Baixa Verde, e que não sei se o assalto ocorreu a titulo de represália,
pois nada foi feito que pudesse dar lugar a tal violência, uma vez que o fornecimento
d’água vinha sendo feito normalmente (um tanque por diariamente).
Mais
adiante apareceu no artigo do dia 17 : “depois percebendo que não existia a
necessidade imprescindível do fornecimento da água para Baixa Verde que possuía
açudes e não se ressentiria da falta do liquido e ainda porque o abastecimento
pela Rede provocaria prejuízo a Ferrovia, resolveu a Administração local suspender
a ida do vagão tanque para a cidade referida”. Esclareço que não foi sustada a
ida do vagão tanque para Baixa Verde em tempo algum, os fornecimentos
continuaram normais. Somente agora após o
terceiro assalto ao trem é que foi interrompido porque houve não houve mais
trem para aquela localidade.
Mais
adiante: “surge o deputado Aluízio Alves que interfere junto ao Dr. Renato
Feio, solicitando a reconsideração da medida conseguindo que o vagão tanque da
Sampaio Correia voltasse a abastecer Baixa Verde. Como a autorização demorasse
a chegar o povo passou a assaltar os trens roubando-lhes toda a água que levava”.
Peço seja retificado o tópico a cima esclarecendo que não foi bem que o dr. Aluízio
Alves solicitou a presidência da Rede
Ferroviária Federal S.A, talvez fosse sobre o abastecimento de 50% no valor do
frete da água e sobre o aumento dos vagões tanques.
Durante
o ano de 1958 até o fim de janeiro de 1959 vinha a Estrada de Ferro fornecendo
um tanque de dois em dois dias, e, as vezes diariamente.Recebi
aqui, então, (talvez em consequência da atuação do Dr. Aluízio Alves) ordem
para conceder o abatimento de 50% no frete da água, e depois para fornecermos
de qualquer forma um vagão tanque diariamente, referida ordem foi cumprida imediatamente
desde o dia 3 do corrente.
Para
atender esta ordem fui forçado a mandar retirar um dos carros de passageiros do
trem de Baixa Verde, substituindo por um vagão tanque. É conveniente salientar
que aos domingos não há trem para Baixa Verde e por isso não se remete vagão
tanque para ali.
A seguir dou a baixo um resumo estatístico do
fornecimento d’água feito a Baixa Verde
em 1958 comparativamente com anos anteriores:
Ano
|
Nº
de tanques
|
Litros
|
1953
|
363
|
5.570,000
|
1954
|
318
|
6.558,000
|
1955
|
315
|
3. 802,000
|
1956
|
267
|
4.007,000
|
1957
|
225
|
4.177,000
|
1958
|
273
|
5.330,000
|
Desejo
adiantar que tendo recebido hoje dia 18, solicitação do prefeito de Baixa Verde
para fornecimento d’água determinei ida para ali de um trem conduzindo
exclusivamente água, sendo dois tanques de 30.000 litros para a prefeitura
local.
Infelizmente
não pude ainda ser restaurado o trafego dos trens, por não ter o sr. Secretário
de Estado da Segurança Pública, tomado até o momento qualquer providencia no sentido
de garantir a segurança do trafego ali.
Certo
de vossa atenção, neste ensejo subscrevo-me com estima e consideração.
José
Manoel Vanderlei Filho
Delegado
regional
Fonte: Diário de Natal, 19/02/ 1959, p. 2 e 8.
Considerações do autor do blog
Pelo
exposto a cima ficamos sabendo dos fatos ocorridos naquele ano de 1959 em que se deu ao menos 3 ataques a trens
pela população que protestava pelo acesso água potável, o último desses ataques
foi incitado pelo então jornalista Geraldo Melo que viria a ser governador do
estado em 1986, a época do fato ocorrido em João Câmara ligado politicamente a Aluízio
Alves.
Interessante
notar que o serviço de abastecimento de água por meio de vagões tanques
ocorriam regulamente para João Câmara desde 1953 conforme se deduz dos dados estatísticos
apresentados pelo diretor regional da RFFSA citado a cima.
Mais
digno de nota ainda é a afirmação do jornal Diário de Natal de que a prefeitura
de João Câmara procurava lucrar com a miséria da população revendendo o precioso
liquido pelo preço 3 vezes mais que o frete cobrado pela RFFSA.
Siglas usadas nesse texto
EFSC-Estrada de Ferro Sampaio Correias.Usada por nós.
RFFSA-Rede Ferroviária Federal S.A.Usada por nós.
RFN-Rede Ferroviária do Nordeste.Usada uma vez pelo jornal citado.
As respectivas siglas se referem a uma mesma empresa ferroviária, ou seja a estrada de ferro que ligava Natal a São Rafael denominada Estrada de Ferro Sampaio Correia, a época encampada pela Rede Ferroviária Federal S.A.
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