quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

SOBRE O ATAQUE AO TREM DA EFSC EM JOÃO CÂMARA


    Um trem da EFSC foi atacado em João Câmara quando se dirigia para a cidade de São Rafael em 16/02/1959.Uma multidão de populares comandada pelo jornalista Geraldo Melo, que concitou o povo a retirar a água existente num dos vagões tanques e ainda toda a lenha existente na fornalha da composição.
      A multidão obstruiu a linha com dormentes impedindo o avanço do comboio e depois colocaram novos dormentes do lado oposto ao maquinista, prendendo o trem evitando que prosseguisse viagem.

O motivo do ataque
   Segundo informações preliminares do jornal Diário de Natal a atitude verificada em João Câmara foi uma represália em consequência da suspensão d’água que a EFSC fazia para a cidade de João Câmara, fornecimento que havia sendo feito a algum tempo por preço irrisório. Com a encampação da EFSC a Rede Ferroviária S.A, houve um reajuste dos preços.
      A água era vendida pela prefeitura com grande margem de lucro, segundo o jornal Diário de Natal (DIÁRIO DE NATAL, 16/02/1959, p. 2) e depois do reajustamento a própria prefeitura tratou de triplicar o preço do liquido.
   Ainda segundo o mesmo jornal “Depois percebendo que não existia a necessidade imprescindível do fornecimento da água para Baixa Verde, que possui açudes e não se ressentiria da falta do liquido e ainda porque o abastecimento pela Rede provocava prejuízos a ferrovia, resolveu a administração local suspender a ida do vagão tanque para a cidade referida”.

A interferência do deputado Aluízio Alves
      Surgiu o deputado Aluízio Alves que interferiu junto ao presidente da RFFSA Renato Feio solicitando a reconsideração da medida conseguindo que o vagão tanque da EFSC voltaria a abastecer João Câmara.
     Como a autorização demorou a chegar, o povo passou a assaltar os trens roubando toda a água que levavam, sempre obstruindo a linha férrea com dormentes, naquele ano de 1959 já haviam sido 3 assaltos a trens em João Câmara, tendo sido o dia 16/02/1959 o que teve maior gravidade o qual determinou a suspensão dos trens para João Câmara pela diretoria da RFFSA, ficando os trens estacionados em Ceará-Mirim.
   Segundo o Diário de Natal o delegado regional da RFFSA tomou as providencias imediatas ao tomar conhecimento do fato e denunciando os revoltosos a polícia.

Fonte: DIÁRIO DE NATAL, 16/02/1959, p. 2.
    
     Parece que as informações publicadas pelo jornal citado não foram bem explicadas tanto que o diretor da RFFSA escreveu ao jornal para que fosse publicada uma nova reportagem desta vez esclarecendo os fatos ocorridos em João Câmara conforme veremos a seguir.

Esclarecimento da   diretoria da RFFSA   sobre o ataque do trem
    O delegado regional da RFFSA em Natal escreveu ao diário de Natal para esclarecimento do que ocorrera em Baixa Verde sobre os ataques aos trens que transportavam água para a cidade.
      Transcrevemos na integração que foi publicado a pedido pelo referido diretor no jornal citado.
      Título de introdução da matéria de esclarecimento
    “ABASTECIMENTO D’ÁGUA PELA RFN A BAIXA VERDE SEMPRE FOI NORMAL”.
      Subtítulo “Carta de esclarecimento do delegado em Natal”
      Introdução da retificação do jornal: “Recebemos com pedido de publicação a seguinte carta:”
      Texto do delegado regional da RFFSA José Manoel Vanderlei Filho:
      Natal, 18 de fevereiro de 1959
   Sr. Diretor do jornal “DIÁRIO DE NATAL”, li na última página do vosso conceituado jornal no número do dia 17 do corrente um artigo intitulado “distúrbios em Baixa Verde...” diversos tópicos que não correspondem as informações prestadas por telefone a esse jornal, quando me foi pedido explicasse  o que ocorrera.
   Assim, para esclarecer-vos, bem como ao público em geral, peço seja publicado no mesmo local as seguintes informações:
      Sobre o tópico represália “segundo informações da própria Sampaio Correia, a atitude verificada ontem foi uma represália em consequência da suspensão no fornecimento d’água que aquela ferrovia fazia para Baixa Verde”, desejo seja esclarecido que não houve interrupção do fornecimento d’água para Baixa Verde, e que  não sei se o assalto ocorreu a titulo de represália, pois nada foi feito que pudesse dar lugar a tal violência, uma vez que o fornecimento d’água vinha sendo feito normalmente (um tanque por diariamente).
    Mais adiante apareceu no artigo do dia 17 : “depois percebendo que não existia a necessidade imprescindível do fornecimento da água para Baixa Verde que possuía açudes e não se ressentiria da falta do liquido e ainda porque o abastecimento pela Rede provocaria prejuízo a Ferrovia, resolveu a Administração local suspender a ida do vagão tanque para a cidade referida”. Esclareço que não foi sustada a ida do vagão tanque para Baixa Verde em tempo algum, os fornecimentos continuaram normais.  Somente agora após o terceiro assalto ao trem é que foi interrompido porque houve não houve mais trem para aquela localidade.
   Mais adiante: “surge o deputado Aluízio Alves que interfere junto ao Dr. Renato Feio, solicitando a reconsideração da medida conseguindo que o vagão tanque da Sampaio Correia voltasse a abastecer Baixa Verde. Como a autorização demorasse a chegar o povo passou a assaltar os trens roubando-lhes toda a água que levava”. Peço seja retificado o tópico a cima esclarecendo que não foi bem que o dr. Aluízio  Alves solicitou a presidência da Rede Ferroviária Federal S.A, talvez fosse sobre o abastecimento de 50% no valor do frete da água e sobre o aumento dos vagões tanques.
     Durante o ano de 1958 até o fim de janeiro de 1959 vinha a Estrada de Ferro fornecendo um tanque de dois em dois dias, e, as vezes diariamente.Recebi aqui, então, (talvez em consequência da atuação do Dr. Aluízio Alves) ordem para conceder o abatimento de 50% no frete da água, e depois para fornecermos de qualquer forma um vagão tanque diariamente, referida ordem foi cumprida imediatamente desde o dia 3 do corrente.
     Para atender esta ordem fui forçado a mandar retirar um dos carros de passageiros do trem de Baixa Verde, substituindo por um vagão tanque. É conveniente salientar que aos domingos não há trem para Baixa Verde e por isso não se remete vagão tanque para ali.
       A seguir dou a baixo um resumo estatístico do fornecimento d’água feito a  Baixa Verde em 1958 comparativamente com anos anteriores:

Ano
Nº de tanques
Litros
1953
363
5.570,000
1954
318
6.558,000
1955
315
3. 802,000
1956
267
4.007,000
1957
225
4.177,000
1958
273
5.330,000

     Desejo adiantar que tendo recebido hoje dia 18, solicitação do prefeito de Baixa Verde para fornecimento d’água determinei ida para ali de um trem conduzindo exclusivamente água, sendo dois tanques de 30.000 litros para a prefeitura local.
       Infelizmente não pude ainda ser restaurado o trafego dos trens, por não ter o sr. Secretário de Estado da Segurança Pública, tomado até o momento qualquer providencia no sentido de garantir a segurança do trafego ali.
   Certo de vossa atenção, neste ensejo subscrevo-me com estima e consideração.
                             José Manoel Vanderlei Filho
                                 Delegado regional

Fonte: Diário de Natal, 19/02/ 1959, p. 2 e 8.

 Considerações do autor do blog
     Pelo exposto a cima ficamos sabendo dos fatos ocorridos naquele ano de  1959 em que se deu ao menos 3 ataques a trens pela população que protestava pelo acesso água potável, o último desses ataques foi incitado pelo então jornalista Geraldo Melo que viria a ser governador do estado em 1986, a época do fato ocorrido em João Câmara ligado politicamente a Aluízio Alves.
    Interessante notar que o serviço de abastecimento de água por meio de vagões tanques ocorriam regulamente para João Câmara desde 1953 conforme se deduz dos dados estatísticos apresentados pelo diretor regional da RFFSA citado a cima.

     Mais digno de nota ainda é a afirmação do jornal Diário de Natal de que a prefeitura de João Câmara procurava lucrar com a miséria da população revendendo o precioso liquido pelo preço 3 vezes mais que o frete cobrado pela RFFSA.


Siglas usadas nesse texto

EFSC-Estrada de Ferro Sampaio Correias.Usada por nós.
RFFSA-Rede Ferroviária Federal S.A.Usada por nós.
RFN-Rede Ferroviária do Nordeste.Usada uma vez pelo jornal citado.
    As respectivas siglas se referem a uma mesma empresa  ferroviária, ou seja a estrada de ferro que ligava Natal a São Rafael denominada Estrada de Ferro Sampaio Correia, a época encampada pela Rede Ferroviária Federal S.A.
    


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