segunda-feira, 19 de abril de 2021

A VISITA DO HISTORIADOR ROCHA POMBO EM NATAL EM 1917


Prolegômenos

         De acordo com o livro-relato de Rocha Pombo era seu desejo visitar a região Nordeste do Brasil, a época simplesmente chamada de norte do país. Dessa viagem resultou o livro Notas de Viagem (Norte do Brasil), publicado em 1918.

Rocha Pombo saiu do Rio de Janeiro em 21/07/1917, percorreu as capitais e algumas cidades do Nordeste. Em Natal esteve entre 28/09 e 04/10/1917.

Segundo o mesmo Rocha Pombo “as páginas que se seguem refletem apenas as impressões mais flagrantes da minha viagem, e que eu registrei dia a dia, a largos traços, e absolutamente sem preocupações de nenhuma ordem. Dou-as quase na mesma forma em que foram apontadas; e, portanto, sem ao menos algum trabalho de revisão ou polidura” (ROCHA POMBO, 1918, p.19).


Rocha Pombo.


         A seguir como se deu a visita de Rocha Pombo na Capital Potiguar.

Em João Pessoa-PB

Partindo da capital paraibana por trem em 25/09/1918 as 13h20 da tarde onde ainda na estação daquela cidade recebeu as últimas demonstrações de simpatia de muitas das mais distintas.

De acordo com Rocha Pombo “A estrada de ferro não é má. Nem nos passou pela ideia a famosa estrada da Bahia a Aracaju”.

Em Guarabira

Ao anoitecer, chegou a Guarabira, onde devia pernoitar. “Fomos ali recebidos e hospedados fidalgamente pelas primeiras figuras da terra — dr. Juiz de Direito, dr. Promotor Publico, Prefeito Municipal, Presidente da Intendência, Sub-Prefeito, e muitas outras. O professor Alfeu teve a bondade de fornecer-me umas notas acerca da cidade, as quais hei de aproveitar oportunamente”. (ROCHA POMBO, 1918, p.96).

“Guarabira é uma pequena, mas belíssima cidade paraibana”. Rocha Pombo visitou aquela cidade do brejo paraibano a noite em companhia dos cavalheiros que os tinham recebido e ainda conforme Rocha Pombo sobre Guarabira “A parte central é formada por duas grandes praças paralela, quase em anfiteatro, ao alto de uma das quais está a igreja matriz. Estas praças são magníficas ; e são muito bem eliminadas a luz elétrica. Guarabira é sede de um município que vai em plena prosperidade” (ROCHA POMBO, 1918,p.96).

Partiu de Guarabira às 05h00 da manhã para o Rio Grande do Norte.

Da janela do trem da GWBR fez as seguintes observações sobre a paisagem entre Guarabira e Nova Cruz “Como já havíamos notado no trecho de Paraíba a Guarabira, as culturas que se vêm para os lados da linha férrea são principalmente cana de açúcar, algodão, café e mandioca”.

Ao avizinhar-se dos subúrbios de Natal, “vemos de umas alturas grande número de pequenas casas, mas regulares, todas muito vermelhas, como tintas de sangue. É isso devido á cor do barro que serviu para as paredes”.

Segundo Rocha Pombo “Sentimos que o dia parece por ali mais claro. Dir-se-ia que naquelas paragens o sol anda mais perto e brilha mais”.

Chegou o trem á estação de Natal pelas três da tarde. Ali foi recebido pelo ajudante de ordens do Governador e por Nestor Lima, secretário do Instituto Histórico; “os quais nos acompanharam até um hotel chamado parece que Internacional. Ali só encontramos disponível um exíguo aposento, no segundo andar, muito escuro, e sofrivelmente horrível. Alojamo-nos naquela catacumba, onde estivemos perfeitamente emparedados durante sete dias” (ROCHA POMBO, 1918, p.97).

A estação da GWBR onde chegou Rocha Pombo em Natal.


“Logo depois que nos aposentamos, desabou uma forte tormenta de chuva, que nos impediu de ir a palácio agradecer a honra que nos tinha feito o Governador” (ROCHA POMBO, 1918, p.97)..

Andando pelas ruas da capital potiguar Rocha Pombo percebeu que “Em Natal não há viaturas públicas a não serem os bondes. Não vimos ali nem um automóvel, nem um carro de praça. O próprio chefe do Estado anda nos bondes comuns” (ROCHA POMBO, 1918, p.97). [1].

No dia 29/09/1918 pela manhã Rocha Pombo visitou o Instituto Histórico que segundo ele “Acha-se instalado em comum com o Arquivo e a Biblioteca Pública, em bom prédio. Tudo está disposto ali com muito capricho” (ROCHA POMBO, 1918, p.98).

Depois foi a palácio do governo. “Já conhecia eu pessoalmente o desembargador Ferreira Chaves, do Rio, quando senador pelo seu Estado”. O governador os recebeu “com a sua proverbial afabilidade, no seu amplo gabinete onde se achavam muitas pessoas, naturalmente políticos, habitues do café oficial” (ROCHA POMBO, 1918, p.98). O governador Ferreira Chaves apresentou a todos. Quando chegou a vez de cumprimentar o coronel Pedro Soares, “disse-nos s. ex.: — É o meu Murtinho”. O coronel era o secretário da Fazenda; “e disseram-me que realmente é homem de excepcional competência para aquele cargo” escreveu Rocha Pombo. Quando quis despedir-se, o Governador os convidou gentilmente para ver o palácio. “S . ex. em pessoa nos levou ás varias salas.Entre estas o salão nobre é magnífico. Referiu-nos s. ex. que um colega seu, chefe de um dos Estados vizinhos, ao visitar uma vez o palácio, ficou admirado ao entrar naquele salão exclamando: -— Pois voês já tem isto por aqui!” (ROCHA POMBO, 1918, p.99).

Palácio do Governo visitado por Rocha Pombo

Salão nobre do palácio do governo elogiado por rocha Pombo.

Governador Ferreira Chaves, anfitrião de Rocha Pombo em palácio.


“De uma das janelas têm-se vistas belíssimas, principalmente para o estuário do Potengy”, (ROCHA POMBO, 1918, p.99).


O rio Potengi.


Deixando o palácio do Governo, “tomamos um bonde para Petrópolis, bairro alto, á vista do mar, ao sul da barra”. Sobre os aspectos de Natal escreveu rocha Pombo “A cidade é muito asseada e alegre. Ruas bem largas e bem calçadas quase todas; prédios de bom gosto, alguns grandiosos. Vastas praças. A fronteira ao palácio, e outras, são ajardinadas. Em caminho de Petrópolis, passa-se ao lado de extenso campo que se reserva, segundo nos informaram, para um parque. Do outro lado do Potengy, junto á barra, e também para o sul, ha imensa dunas de areia muito branca. Muitos desses altos cerros de areia vínhamos já avistando ontem quando em viagem, muito longe para as bandas do mar. Do alto das dunas de Petrópolis, o horizonte, para o mar e para a terra, é estupendo”. (ROCHA POMBO, 1918, p.99).


Aspecto da Cidade Alta


Rocha Pombo recebeu a visita do coronel Pedro Soares, que era também presidente do Instituto Histórico; do desembargador Vicente Lemos, “ incansável investigador da historia natalense”; e de Nestor Lima, advogado, professor “e também cultor dedicado da nossa historia” (ROCHA POMBO, 1918, p.99).

No dia 30/09/1918 registrou Rocha Pombo que “A imprensa de Natal é talvez a mais modesta que encontramos nas capitais do norte, depois da de Vitória. Publicam-se ali três jornais, sendo A República o mais importante. É hoje órgão, se não propriamente oficial, ao menos oficioso do Governo, e existe desde antes de 15 de Novembro, contando, pois, 29 anos de existência. É jornal de grande formato e muito bem feito. Foi fundado em Julho de 1889 pelo dr. Pedro Velho. A memória deste homem é ali muito venerada; e todos apontam os serviços por ele prestados a Natal, como primeiro Governador do Rio Grande do Norte. Foi ele quem organizou o Estado sob o novo regime. Tem estatua numa das praças, junto ao edifício do Congresso. É pena que o monumento não seja grande coisa como arte  (ROCHA POMBO, 1918, p.101).

“Em outra praça vê-se também a estátua de Augusto Severo. Esta, como obra de arte, não é melhor: o malogrado aeronauta está muito diminuído na estética da sua figura” (ROCHA POMBO, 1918, p.101).

Os dois outros jornais eram a Imprensa e a Nota. “Este último parece que não é diário” e de acordo com Rocha Pombo “Por ali não há lutas políticas, pelo menos tão acirradas como na imprensa paraibana”. (ROCHA POMBO, 1918, p.101).

Percebeu Rocha Pombo que “Há em Natal alguns grupos escolares.Aliás, isto é comum em todos os Estados do norte: não ha uma só capital onde se não encontrem estabelecimentos dessa ordem, que já entraram — pode-se dizer — definitivamente no regime do ensino” (ROCHA POMBO, 1918, p.101).

“Felizmente — não cessarei de dar testemunho — a instrução popular é objeto da preocupação e do esforço de todos os governos e de todas as populações” (ROCHA POMBO, 1918, p.101).

Nos dias 01 e 02/10/1917 rocha Pombo fez alguns passeios e visitas, “adiantando os nossos trabalhos de pesquisa”.

No dia 03/10/1917 “Muito grato me foi receber a visita do Dr. Jerônimo Cueiros, lente da Escola Normal, homem de espírito culto e alta competência em história. Infelizmente já não era tempo de retribuir-lhe pessoalmente e agradecer a fineza”.

“Também recebi, na véspera de embarcar, alguns livros que me ofereceram d. Isabel Gondim, e o Dr. Oscar Brandão. Este ilustre homem de letras escreveu-me, remetendo a suas obras, uma carta extremamente amável. Também d. Isabel Gondim. Hei de ter ensejo de ocupar-me das obras com que me obsequiaram estes autores” (ROCHA POMBO, 1918, p.103).

Em 04/10/1917 “Quinta-feira. Acaba de chegar, pela manhã, o Acre, a bordo do qual devemos seguir para o Ceará. Como o vapor só sairá pela tarde, aproveitamos ainda o dia para ver alguma coisa”.

Em companhia do Dr. Horácio Barreio, Secretário Geral do Governo, e do dr. Nestor Lima, visitamos o Hospital da Santa Casa, no alto de Petrópolis, e o Isolamento da Piedade. O Hospital não é de vastas proporções; mas está muito bem montado, achando-se os vários gabinetes providos de instalações modernas, principalmente os de cirurgia e de clinica hidroterápica. O desembarcador Ferreira Chaves está mandando ampliar o edifício. O Isolamento, para alienados, é um como ensaio de hospício; e já está prestando serviços relevantes. É dirigido pelo Dr. Santiago Varela[2]. Também está sendo renovado”.

“Pela tarde, um pouco antes do embarque, tive a honra de receber, no próprio refeitório do hotel (pois que sala para isso não havia) uma comissão do Instituto Histórico. Nessa ocasião dirigiu-me palavras de muito conforto o dr. Nestor Lima, de cujas mãos recebi o titulo de sócio honorário. Feitas em seguida as últimas saudações e agradecimentos, fomos para bordo, ás 5 horas da tarde”.

“Às 6 o vapor levantou ferros. Pelas 11 da noite, avistamos o farol do Cabo S. Roque. Começamos a rumar para noroeste” (ROCHA POMBO, 1918, p.104). Rocha Pombo se dirigia para o Ceará.

 

 

Fonte: POMBO, Rocha. Notas de Viagem (Norte do Brasil). Benjamin de Aguilar  Editor: Rio de Janeiro, 1918.



[1] Isso mesmo que você leu! Houve um tempo em que o Governador do Rio Grande do Norte andava de bonde público para ir ao trabalho. Eram outros tempos. Agora imaginem o/a Excelentíssimo/a  Governador/a  do Rio Grande do Norte andando no coletivo da Guanabara as 05h00 da manhã para ir despachar no Centro Administrativo do Estado. Nem em propaganda do horário político tal coisa é cogitada.

 

[2] Varela Santiago.

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