terça-feira, 17 de outubro de 2017

VISITA DE UM CAPUCHINO EM MIPIBU EM 1761

          Frei Aníbal foi um frade capuchinho que visitou o nordeste do Brasil em meados do século XVIII, ao Rio Grande do Norte empreendeu visita em 1761 na aldeia de Mipibu, atual município de São José de Mipibu que fora inicialmente uma missão dos frades capuchinhos.

O homem
            Frei Aníbal nasceu 1723, entrou para a ordem dos capuchinhos em 1740, faleceu em Genova em 17 de maio de 1785.Na época da visita de frei Aníbal haviam sete missões espalhadas pelo Nordeste, duas estavam no Rio Grande do Norte, a de Mipibu e a de Apodi.

A viagem para Mipibu
            Frei Aníbal veio a Mipibu para substituir o pároco frei José Antônio de Mandvi. Para Mipibu viajou no dia 09/04/1761 percorrendo 50 léguas para chegar até a missão, feito segundo as crônicas da missão em caminho regular. A missão de Mipibu distava 7 léguas de Natal, tendo sido edificada pela missão dos capuchinhos “ em formato de praça de armas com casas unidas como se servissem de aquartelamento”, nessa configuração as casas dos oficiais ocupavam os vértices da praça, com duas portas cada qual. A igreja possuía apenas uma nave e mostrava-se bem fabricada e assaz decente.

Na Aldeia de Mipibu
            Segundo o relato de frei Aníbal haviam 250 famílias de índios vivendo na missão de m
Mipibu, sendo guiadas pelo pároco. Era o pároco quem elegia o capitão-mor local e seus subalternos imediatos. As patentes eram passadas pelo capitão-mor do Rio Grande do Norte, porem podiam ser anuladas pelo missionário. Em Mipibu existiam duas companhias compostas por 140 homens “cada qual bem instruídos no serviço militar”.
            Segundo o relato do frei Aníbal foi preciso cassar as patentes dos oficiais de Mipibu, exceto a do sargento-mor e de um capitão, como justificativa para tal, diz frei Aníbal que os oficiais cassados não cumpriam com as obrigações do seu estado [militar].
            Frei Aníbal fez uma descrição sui generis sobre a gente que havia na região. Segundo ele os povos autóctone do Brasil eram de duas categorias, os caboclos e os tapuios, sendo os primeiros “quase brancos, algo  encardidos” já os segundos eram na descrição do capuchinho “cor de tijolo, de ombros largos, rosto grande, nariz  chato, tronco robusto, gente agigantada”. De ambas as nações andavam nus, tanto homens como mulheres, só para entrar na igreja colocavam uma espécie de fraldas e calções, entretanto a força de muita ameaça e castigo.
            Segundo Frei Aníbal os tapuias se mostravam preguiçosos, supersticiosos, amigos do alheio [roubavam], mentirosos, falsos, luxuriosos e infiéis. Já os caboclos se mostravam mais civilizados e domesticados. A língua dos índios caboclos era diferente da dos tapuias, no entanto, tanto um como o outro eram capazes de falar o português.
            Estavam sujeitos a uma disciplina severa, deviam viver dentro dos limites do aldeamento de onde não podiam sair sem a licença do missionário.
            A aldeia de Mipibu media uma légua em quadra onde podiam viver bastante bem, afirmava frei Aníbal, mas eram os aldeados muito desorganizados. A maioria morria de fome, num eterno nomadismo, furtando aqui e acolá, escreveu o missionário. Era comum chegar ao missionário de Mipibu queixas dos índios da missão o qual se via forçado a castigar os que eram denunciados.
            As autoridades usavam de meios coercitivos para obrigar os índios a plantar o roçado de mandioca, eram a cada instante fiscalizados. Um dos trabalhos dos missionários era vigiar para que os índios não furtassem uns aos outros a produção do roçado. Nem a lavoura do roçado do frei Aníbal foi poupada dos furtos dos índios. Onde num roçado que produziria 400 sacas de farinha só conseguiu colher 50, precisando pedir ajuda a um vizinho branco da aldeia e aos dois escravos africanos que o acompanhavam.
            Era costume dos fazendeiros brancos obrigar os índios das aldeias a servi-los com a anuência dos missionários. Quando terminavam o serviço, os alugadores deviam levar a té o pároco a importância dos jornais “por que de outro modo não adquiririam o que lhes era essencial como pano para si e os seus, gastando num dia, sobretudo em aguardente, o que havia ganho num mês “.
            Os aldeados deviam trabalhar um determinado tempo nas roças paroquiais para o sustento do cura e seus fâmulos. Os de Mipibu pescavam no lago do mesmo nome dando parte da pesca a paróquia.
            Em Mipibu faltavam 7 famílias que haviam desertado da aldeia segundo constava na relação do frei Aníbal. O alferes mandou dois soldados os procurar com a promessa de não os castigar e anistia-los, voltaram 48 pessoas, entre homens, mulheres, adultos e crianças, estavam emagrecidos e maltrapilhos que “o seu aspecto era de infundir a maior compaixão”.
            No primeiro domingo após esse fato, o frei Aníbal reuniu os aldeados par afazer uma revista, onde os exortou vivamente ao trabalho e a obediência e mandou suspender todas as penas em vigor. Aproveitou ainda para fazer o censo rigoroso dos índios e os soldados das duas companhias de Mipibu.
            O missionário não recebia dinheiro algum dos paroquianos, o que lhe vinha moeda era procedente dos serviços prestados, nas vizinhanças aos senhores de engenho por ocasião de alguma grande festividade, onde os fazendeiros lhes davam uma esmola, por vezes larga, que contribuía para melhorar a escassa renda do padre.
            Infelizmente frei Aníbal não fez nenhuma menção a essas festas que ocorriam nas vizinhanças da missão de Mipibu, nos engenhos de açúcar, que seriam de grande importância para se compreender os costumes dos tempos coloniais potiguar. Os relatos do frei quase sempre se resumiam as suas atividades catequéticas.


Publicado na revista Excelsior, 1939, p. 70 -72, por Afonso de e. Taunay.

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