Em
29/12/1888 deu entrada na Secretaria de Agricultura, Comércio e Obras Públicas,
um requerimento do engenheiro João Chkockatt Sá Pereira de Castro, pedindo ao
Governo imperial, privilégio para a construção e gozo de uma estrada de ferro partindo
do porto de Macau, no Rio Grande do Norte, à foz do rio Pajeú, afluente do rio
São Francisco, em Pernambuco, passando pela Paraíba, e partindo ao meio a zona
sertaneja destas três províncias.
O jornal
O Povo publicou artigo do engenheiro José Leão escrito em setembro de 1889 no
qual tratava a respeito dos benefícios que trariam para a região a construção
de uma estrada de ferro interprovincial entre o porto de Macau e a foz do rio
São Francisco cortando o interior do Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco
na parte mais assolada pelas secas.
Segundo
o engenheiro potiguar, José Leão, essa estrada resolveria plenamente o grande
problema da ligação do vale do rio São Francisco na parte em que não era
servido pela navegação, com um porto de mar e pelo mais curto caminho, como
demonstrava qualquer carta geográfica do Império. (O POVO, 12/10/1889, p.1-2).
Acrescente-se
ainda que a projetada Estrada de Ferro de Macau ao São Francisco poria as ricas
salinas do rio Assu, situadas ao nascente da cidade de Macau, ao alcance das
províncias da Bahia (margem esquerda do São Francisco), Piauí e Ceará
(respectivamente Jaicó e Crato), Alagoas, Sergipe (pelo alto sertão),
Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte (pelo interior), pois terminaria a
referida ferrovia na convergência das 5 primeiras províncias.
A
ferrovia resolveria outro grande problema de alcance humanitário, visto que as
populações do sertão de todo o norte estavam naquele momento ameaçadas pela seca, cuja a que se verificou
entre 1799 e 1793 assolou toda a parte onde estava situada a região da
projetada estrada de ferro e que quase um século depois se repetia com a mesma
intensidade e consequências.
Segundo
o engenheiro José Leão a construção da projetada estrada de ferro de Macau ao
São Francisco era já da mais urgente necessidade quando já se manifestavam os
sintomas da terrível calamidade climática (O POVO, 12/10/1889, p.1-2). Dessa
maneira, pois, ficava resolvida a questão de proporcionar trabalho ao invés de
socorros paliativos a essas populações.
A
Estrada de Ferro de Macau ao São Francisco, ao contrário, faria sobressair a
viação férrea da Bahia, Alagoas e Pernambuco e traria a província da Paraíba e
do próprio Rio Grande do Norte que estavam estacionadas em relação ao
desenvolvimento econômico e material, um destino diverso, ligando-as por meio
da referida ferrovia aquelas demais províncias (O POVO,12/10/1889, p.1-2).
Em 23/03/1889 o jornal O Povo registrou que havia sido organizada um companhia na Corte com o intuito de atravessar com uma estrada de ferro a zona flagelada pelas secas das províncias do Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco até o rio São Francisco. E maior foi a esperança do citado jornal ao saber que os males comuns das províncias vizinha despertavam atenção do governo, animando e auxiliando os intuitos generosos daquela grande empresa.
A representação da Câmara Municipal de Macau
Em
22/01/1889 a Câmara Municipal de Macau enviou uma representação ao Imperador
Dom Pedro II sobre a estrada de ferro que se projetava fazer partindo de Macau
para o vale do rio São Francisco e interior de Minas Gerais.
O oficio da Câmara de Caicó
Em 15/03/1889 o jornal O
Povo publicou o oficio da Câmara
Municipal de Caicó enviado ao presidente da província onde apresentava como
solução para o problema da estiagem na região do Seridó a construção da
projetada Estrada de Ferro de Macau ao São Francisco (O POVO, 22/03/1889, p.4).
O
jornal A República
O jornal A República recebeu um folheto sobre a projetada estrada de ferro de Macau ao São Francisco, cortando uma vasta zona do norte através da província potiguar, Paraíba e Pernambuco. O mencionado folheto trazia como apêndice uma carta da região que a estrada teria de percorrer. ”É um assunto muito mais importante e útil do que as tricas eleitorais. Dele nos ocuparemos no seguinte número” (A REPÚBLICA, 22/07/1889, p.3).
Queda da monarquia e advento da República
Os acontecimentos políticos que culminou com a queda da monarquia e advento da Republica em 15/11/1889 e seus desdobramentos posteriores arrefeceram a ideia da construção da projetada Estrada de Ferro de Macau ao São Francisco, mas já em 1890, no novo regime político brasileiro parecia que tomava incremento a ideia desse imenso melhoramento dos sertões do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas e Ceará, e outros, melhoramento que, conseguido, faria a par da nossa atividade e labor, dispensar os socorros públicos nas secas.
A
conferência do engenheiro Chrockatt no Cube de Engenharia
O engenheiro João Chrockatt de Sá Pereira Castro realizou em 25/05/1889 uma conferência no Clube de Engenharia no Rio de Janeiro a respeito da projetada Estrada de Ferro de Macau ao rio São Francisco, a qual foi publicada na Revista das Estradas de Ferro na edição de maio/jun de 1889.
Segundo ele: "Me
parece que o projeto de via férrea que apresentei resolve desde já o problema
da fixação ao solo da população, além dos resultados futuros que
necessariamente há de produzir.
Esse
projeto consiste em uma linha que partindo do porto de Macau no Rio Grande do
Norte, se dirija pelo vale do rio Açu ou Piranhas e depois pelo do Pajeú, até a
barra deste no rio São Francisco, atravessando as províncias do Rio Grande do
Norte, da Paraíba e Pernambuco, com um desenvolvimento aproximado de 400 km.
No requerimento que apresentei ao parlamento ( e estou a isso autorizado por um grupo de capitalistas que apoiam o meu projeto) comprometer-me-ei a encetar os estudos definitivos 30 dias depois de celebrado o contrato e a atacar a construção, que não mais será interrompida logo que o governo aprove os estudos feitos. Ficará, pois, constituída uma importantíssima rede de comunicações interiores".
A linha atravessaria os seguintes municípios: Angicos, Assu,
Santana do Matos, Triunfo (Campo Grande), Imperatriz (Martins), São Miguel de Jucurutu, Príncipe (Caicó) e Serra
Negra, no Rio Grande do Norte. Catolé do Rocha, Patos, Pombal, Misericórdia e
Piancó, na Paraíba. Flores, Vila Bela, Triunfo, Ingazeira, Floresta, Cabrobó,
Tacaratú, em Pernambuco.
São servido, mas não atravessados os seguintes municípios:
Mossoró, Apodi, Pau dos Ferros, Portalegre, Jardim, Acari, no Rio Grande do
Norte. Brejo do Cruz, Souza, Cajazeiras, Sabugi e Teixeira, na Paraíba.
Segundo o último recenseamento e admitida a porcentagem de
aumento de 2% como estabeleceu o Sr. Favila Nunes, em seu trabalho: População,
Território e Representação Nacional do Brasil - a população destes municípios será:
Província
do Rio Grande do Norte |
||||
Freguesias |
População
1872 |
Aumento
de 2% |
Aumento
em 16 anos |
Total
em 1888 |
São João Batista do Assu |
8.891 |
177 |
2.832 |
11.723 |
Santana (Santa do Matos) |
10.200 |
204 |
3.264 |
13.473 |
São José dos Angicos |
5.160 |
103 |
1.648 |
6.808 |
N. Srª da Conceição de Macau |
3.941 |
78 |
1.218 |
5.189 |
Santana do Triunfo |
5.709 |
114 |
1.824 |
7.533 |
Santana do Principe (Caicó) |
9.847 |
196 |
3.136 |
12.983 |
N.Srª do Ó de Serra Negra |
2.747 |
54 |
864 |
3.611 |
N.Srª da Conceição do Jardim |
7.678 |
153 |
2.418 |
10.126 |
N. Srª da Guia do Acari |
11.520 |
130 |
2.080 |
13.600 |
N. Srª das Dores do Patu |
4.921 |
98 |
1.568 |
6.489 |
N. Srª da Conceição dos Pau dos Ferros[1] |
19.635 |
329 |
6.272 |
25.907 |
São João Batista de Portalegre |
3.165 |
63 |
1.008 |
4.173 |
Santana da Imperatriz |
11.035 |
221 |
3.536 |
14.621 |
São Sebastião de Caraúbas |
3.372 |
67 |
1.072 |
4.444 |
São João Batista do Apodi |
6.638 |
132 |
2.112 |
8.750 |
Santa Luzia de Mossoró |
8.000 |
160 |
2.560 |
10.560 |
Total |
122.518 |
2.342 |
37.472 |
159.990 |
Província da Paraíba
do Norte |
|
|||
Freguesia |
População
em 1872 |
Aumento
de 2% |
Aumento
em 16 anos |
Total
em 1888 |
N. Srª da Guia de Patos |
6.757 |
135 |
2.160 |
8.917 |
Santa Maria Madalena do Teixeira |
7.338 |
146 |
2.336 |
9.674 |
Santa Luzia do sabugi |
4.290 |
85 |
1.360 |
6.659 |
N. Srª do Bom Sucesso do Pombal |
12.982 |
249 |
3.981 |
16.968 |
N.Srª dos Remédios do Catolé do Rocha |
17.021 |
340 |
5.410 |
22.460 |
Santo Antonio do Piancó |
13.669 |
273 |
4.368 |
18.039 |
Misericórdia |
6.715 |
134 |
2.144 |
8.851 |
N.Srª da Conceição da Misericórdia |
7.961 |
158 |
2.528 |
10.452 |
N.Srª dos Remédios de Souza |
17.594 |
351 |
5.616 |
23.212 |
N.Sr do Rosário de São João de Souza |
12.177 |
242 |
3.872 |
16.040 |
N.Sr da Piedade de Cajazeiras |
7.020 |
140 |
2.240 |
9.261 |
São José de Piranhas |
5.955 |
119 |
1.904 |
7.857 |
Lagoa do Monteiro |
10.502 |
210 |
3.360 |
13.869 |
Total |
129.960 |
2.582 |
41.372 |
171.332 |
Província
de Pernambuco |
||||
Freguesia |
População
em 1872 |
Aumento
de 2% |
Aumento
em 16 anos |
Total em 1888 |
N. Sr da Penha de Vila Bela |
5.548 |
110 |
1760 |
7.309 |
N. Srª da Conceição de Pajeú de Flores |
10.693 |
213 |
3.408 |
14.100 |
N.Srª das dores do Triunfo |
7.336 |
146 |
2.336 |
9.676 |
São José da Ingazeira |
12.554 |
251 |
4.016 |
16.579 |
Bom Jesus dos Aflitos da Fazenda Grande (Floresta) |
15.153 |
302 |
4.832 |
19.980 |
N.Srª e São Gonçalo de Cabrobó |
8.472 |
169 |
2.701 |
11.175 |
Total |
59.756 |
1.191 |
19.056 |
78.812 |
Recapitulação |
||||
Províncias |
População
em 1872 |
Aumento
de 2% |
Aumento
em 16 anos |
Total em 1888 |
Rio Grande do Norte |
122.518 |
2.312 |
37.472 |
159.990 |
Paraíba |
129.960 |
2.532 |
41.372 |
171.332 |
Pernambuco |
59.756 |
1.191 |
19.056 |
78.812 |
A
população total dos municípios servidos pela estrada era pois de 410.134
habitantes. Sendo, segundo o Sr. Favila Nunes, a população do Rio Grande do
Norte de 308.852, a da Paraíba de 496.618 e a de Pernambuco de 1.110.839, vê-se
que metade da população do Rio Grande do Norte e mais um terço da da Paraíba é
vitima da seca.
Em relação a Pernambuco, como só foram computados 7
municípios a proporção é mais favorável, mas entrando em cálculo com toda a
população do sertão, esta será de um quinto.
O
ocaso
Em
1890 o engenheiro João Chrockatt de Sá Pereira Castro havia solicitado
novamente a concessão ao Governo Federal de uma estrada de ferro ligando
diretamente o Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco à Bahia, Minas Gerais e
Rio de Janeiro.
A resposta dada pelo Governo Federal foi que ainda que não houvesse incompatibilidade legal, parecia, todavia de prudente conselho que os engenheiros do Ministério da Agricultura se abstivessem de solicitar tais concessões (REVISTA DE ENGENHARIA, 1890, p.6).O referido engenheiro fazia parte dos quadros de funcionários do Ministério da Agricultura.
O projeto Nº 161 de 1893 determinava que fossem acrescidas à
viação geral do norte da República várias linhas projetadas, dentre estas a
estrada de ferro de Macau ao São Francisco, desenvolvendo-se pelos vales dos
rios Piranhas e Pajeú, de modo a servir os estados do Rio Grande do Norte, Paraíba
e Pernambuco (ANAIS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1893, p.548).
A efêmera existência da projetada Estrada de Ferro de Macau
ao rio São Francisco tem assim o seu o caso e posterior desaparecimento, tendo
sido o projeto engavetado nos porões da burocracia governamental e suplantado
pelos acontecimentos políticos que sucedeu entre a queda da Monarquia e advento
da República.
Parte do traçado seria mais tarde aproveitado na Estrada de
Ferro de Mossoró. Quanto a Macau, os trilhos só viria a tocar seu território
somente em 1962 quando foi ali
inaugurada a estação da Rede Ferroviária do Nordeste (Estrada de Ferro Sampaio
Correia), cujo ramal a partir de Lajes teve inicio em 1914, ainda assim, ramal
não previsto no projeto original da EFCRGN.
No mapa a baixo um traçado aproximado do que seria o traçado da projetada Estrada de Ferro de Macau ao São Francisco com sua extensão em km em linha reta.
[1]As freguesias compreendidas entre Pau dos Ferro e Mossoró pertenciam ao Vale do Apodi-Ipanema e ficavam no extremo sertão confinando com o Ceará, mas mesmo assim seriam servidas pela ferrovia interprovincial.
Nunca é tarde, mas, infelizmente, duvido que saia do papel.
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